terça-feira, 11 de outubro de 2011

As horas que se somam à eternidade

As portas estavam trancadas e a luz apagada, só algumas pontinhas do sol que imperava lá fora entravam pelas frestas da janela e davam ao nosso cantinho aquele meio tom confortável. O silêncio era total. Nós dois estávamos em paz na companhia um do outro e nada precisava ser dito. Respirávamos baixinho, num cochilo meio lá meio cá. Com a cabeça acomodada entre seu ombro e parte do braço direito, que me segurava por baixo enquanto seu braço esquerdo me cobria por cima, eu segurava sua mão e naquele sossego impenetrável me senti a mulher mais protegida do mundo. Estávamos tão bem encaixados. 


Você dormia com a cabeça recostada à minha e seu suspiro, bem perto do meu ouvido, me fez relaxar profundamente. Não havia nada que eu pudesse querer naquele instante, tudo o que eu desejei por tanto tempo estava ali, acontecendo, e eu fiquei atônita ao perceber isso, como sempre fico quando me dou conta de algum sonho que se realiza. Você dormia tranquilamente, mas eu não consegui, só precisava curtir a sensação indescritível de um sonho de amor que se realizava comigo ali, tão consciente de tudo. Você me amparou de um jeito que eu ainda não tinha experimentado. Você estava ali, entregue, sem pressa, livre, e me deixando ser livre também, como tanto gosto. Só nós dois e o nosso acalanto, que se torna mais íntimo a cada dia, que nos aproxima cada vez mais. 

Naquele momento cheguei a pensar que nada poderia ser mais certo na vida. Não é possível que todas as razões que existem para que não estivéssemos ali, juntos, sejam mais fortes do que essa que nos leva a estar, sempre que possível, entrelaçados. Tudo o que somos quando estamos juntos, a forma como nos correspondemos e nos identificamos, é tudo tão raro. Exercitamos a aceitação e a admiração com tanta naturalidade! Não pode ser que essa história seja feita para acabar um dia. Pelo menos agora isso é impensável pra mim. 

Alguns minutos antes, eu passava a ponta dos dedos nas suas costas, no seu quadril, entre os cabelos da sua nuca e pensava: “sou apaixonada por você”. Estávamos desfrutando de algo que parece tão simples mas que eu sei, não acontece com tanta freqüência entre os casais. Não tinha acontecido comigo até então. Então eu entendi por que você lamentava, há poucos dias, o fim do que a gente tem. É porque isso que a gente tem é mágico demais pra acabar. Seria um desperdício enorme desse exercício de vida regada das mais sinceras ações.

Me deixa ver o seu amor mais de perto, me deixa te acariciar com mais freqüência, fica em silêncio comigo assim por uns minutos a mais. Isso me prende a você de uma forma como nunca fiquei presa antes. Me deixa ser importante na sua vida também. Sou tão apaixonada por você! Fica mais um pouco, deixa tocar mais uma música, segura a ponta dos meus dedos por mais um tempo, desse jeito que só você faz. Me concede o direito de rir das minhas próprias imperfeições só mais um pouquinho. Fica. Dois minutos, tá? Me deixa te mimar. Tenho tão pouco a te oferecer... mas nada pode impedir que esse pouco te seja entregue da forma mais sincera e mais amorosa. Eu posso fazer isso, eu quero. 


Quero te olhar de perto muitas e muitas vezes ainda e sentir, em todas elas, o gosto bom que isso tem. Ver seus olhos de menino se mexendo pra lá e pra cá conforme se expressa e lembrar, enquanto os observo, que foram eles que me capturaram há mais de um ano. Não há nada que eu não possa confessar a você. Assim como não há nada que eu queira te esconder. Diante de você sou exatamente como sempre quis. E diante do seu amor sinto uma disposição surpreendente em ser o melhor que posso, em oferecer tudo o que tenho, em, enfim, te fazer feliz. Sou mesmo, e ainda, e acho que sempre, apaixonada por você.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Versos sem categoria


São tão simplistas teus versos!
Não se encaixam em nenhuma categoria.
Não é arte, não é nada,
O que você pretendia?

São tão bobos teus poemas!
Cheios de rimas previsíveis.
Falam de sentimentos tão rasos,
Facilmente reconhecíveis.

Não sei a quem escreve tanto.
Intriga-me essa tua insistência.
Ou gosta de conversar com o vazio,
Ou quer provocar-me demência.

Investigo tuas letras,
Uma por uma, ponto e acento,
Fuço com zelo teus motivos,
Confundo-me de tanto que tento.

Irrita-me a tua pretensão.
Não é escritora nem dona da palavra,
E ainda assim expõe teu Português básico
Achando que meus sentimentos desbrava.

Desista!
Não hei de admirar-te.
Lerei tuas insanidades até meu último dia
Só pra desdenhar da tua arte.

Saiba que te leio com furor,
Revolta, maldade.
Poderia, ao menos, usar rimas mais nobres
Para denunciar minhas fraquezas à humanidade.

Sede de amanhã

A sede de amanhã
Que desperta a cada primeiro choro
Renova na multidão à volta
O vislumbre ao futuro.

Porque só o recém-chegado
Faz lembrar ao corpo cansado
Quantas possibilidades existem
Pra quem ainda não tem passado.

Despoluído de saudade,
Desprovido de lembrança,
O ser novo depende apenas
Do dia seguinte: sua única esperança.

Por isso é tão livre a alma nova.
Experimenta os instantes
Com tanta fé no que está por vir
Que não se torna refém do que houve antes.

Quem dera o ser vivido
Resgatasse essa sede;
Desejaria tanto o futuro
Que faria mais pleno seu presente.