quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Um oceano de silêncio



Não conseguia compreender o seu silêncio. Sou barulhenta e bagunceira, e isso me torna insensível com os quietos. Com a verdade profunda. Com você, que nutre uma quietude que não aplaca apenas a fala, mas também os olhos, os movimentos, as intenções. Não consigo te ler! O não saber que esse silêncio impõe sempre me incomodou demais, porque eu preciso saber das coisas, gosto de ouvir o barulho das aflições, das exuberâncias, das contenções, das saliências, das dúvidas, das verdades, dos absurdos que compõem cada pessoa. Por mais incertos e tresloucados que sejam esses impulsos, prefiro ouvi-los. Assim como prefiro, desajustada, emiti-los.

Essa minha mania de viver depressa demais não te deixaria mesmo escapar, daí a vontade louca de te tomar num gole só. Mas você não é pra ser tomado em goles, quanto mais num só. Você é um oceano inteiro. Um oceano de águas inexploradas – as vezes temidas, as vezes desafiadas sem qualquer prudência, mas nunca navegadas de verdade. E só agora me dei conta que o seu silêncio é sua defesa. É a forma que encontrou de proteger-se dos medos, das grandes constatações, das próprias revelações. Então você se veste de jangada e se lança à deriva de si mesmo, e quem te sobrevoa se atenta à jangada solitária e esquece o oceano. E lá está você. Aparentemente feito de águas calmas e desabitado. Aparentemente. Escondido e inalcançável.

Senti-me culpada agora. Por fazer tanto barulho. Por não compreender o seu silêncio. Por não respeitar sua autoproteção em forma de sigilo. Por querer fazer onda no seu mar congelado. Só agora entendo muitas das coisas que você disse sem emitir ruído algum. Talvez eu aprenda com você a poupar também as cordas vocais da minha alma, que berra o tempo todo, propagando minha ânsia aos quatro ventos enquanto você só faz engolir a sua. Talvez eu aprenda, finalmente, a não impor minha música pobre aos ouvidos que me circundam. Senti-me egoísta e infantil agora. Porque você suporta as intempéries do tempo e do clima sem reclamar. Sozinho. Calado. Recebe e acolhe as gotas e os granizos despejados pelas tempestades que eu e outras nuvens pesadas impomos sobre você. Mesmo assim você se mantém. Poderia nos afogar se quisesse, mas prefere afogar-se no próprio mistério, e isso te torna cada vez mais profundo, mais distante da superfície. Mais calado.

Olhei nos teus olhos escuros com mais cuidado desta vez. Sem pensar apenas em mim, sem querer tanto, sem intenção nenhuma. Olhei em sossego e com o único intuito de buscar-te. Foi aí que enxerguei mais do que a jangada. Foi quando atentei-me à sua infinitude e à minha  superficialidade. Você é um mar repleto de tesouros e de histórias. De águas límpidas, mas não transparentes. Um oceano de segredos. Impenetrável. Uma dessas obras-de-arte naturais que ainda não encontrou um explorador à altura. Só o silêncio.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Presa na sua fantasia



As vezes você está tão perto, e quando acontece, sinto que finalmente alcancei aquele espacinho raro do seu coração. Mas de repente você se distancia e se fecha. Fico vendo isso acontecer sem saber onde errei, sem conhecer os porquês dessa sua fuga. E não poder fazer nada pra evitar é tão frustrante. Mas meu coração tolo não desiste e, teimoso, se adapta. Então, quando me acostumo a ter de esticar os braços pra te alcançar, você vem pra bem perto novamente e me faz crer que o meu amor foi aceito, que não há ameaças nem condições. Aí me aconchego no seu colo tão perfeito pra mim e me seguro bem forte, esperançosa de que assim permaneçamos até que a nossa música pare de tocar. 

As vezes você faz coisas que surpreendem até um coração romântico e incorrigível como o meu. Sem que eu espere, toma atitudes que gritam amor. Bem que me disseram que você não é de falar, só de fazer. Mas as vezes você se cala de um jeito que não há o que eu faça que consiga arrancar um suspiro seu. E eu tento, alfineto, investigo, observo, imploro, até que, exausta e confusa, simplesmente espero. E me conformo novamente com seu silêncio, por vezes frígido, cruel, insensível; por vezes indiferente, desatento. Aí me calo também, breco os rompantes da minha alma carente e sedenta, e penso estar aprendendo mais uma lição. É aí que seu amor ressuscita, renasce, se recobra do coma que me coloca de castigo, e se declara. 

Uma música, um carinho fora de hora, uma ligação surpresa, uma noite de amor incomum, aquele sorriso diferente, uma palavra, um agrado, cinco minutos a mais... São esses elementos que me prendem a você. Quando acho que não, você quer estar perto e só. O difícil é conseguir prever quando, porque as vezes sou eu que preciso que você queira estar perto. Perto de verdade. Prefiro acreditar que você esquece que eu também tenho necessidades que só você é capaz de suprir.

Será que esse amor, além de improvável, é tão provisório que não pode doar um pouco de segurança? Não faz sentido colecionar dias se eu não puder sentir que estivemos realmente juntos em cada um deles. O que é que te traz e o que é que te leva? Não tenho mais do que abrir mão, e não sei mais até onde posso compreender. Eu também preciso de um pouco de segurança. Pelo menos com relação ao que você sente. 

Algumas respostas encheriam de paz o meu coração e o deixariam mais forte para seguir adiante na nossa corda bamba. Mas acho que isso é pedir demais pra você, cada vez mais silencioso, reservado, arredio. E eu tenho te pedido muito mesmo. Está errado. O correto é não ter de pedir, e é isso que vou fazer daqui pra frente. Talvez pra compensar um pouco de tudo que você, indiretamente, me pede. E mesmo sem as respostas que tanto sonho, ainda estou disposta a me manter firme na corda bamba que leva até você e os seus extremos. Porque apesar do balanço e da ameaça de queda, você permanece aí, a poucos passos diante de mim e com os braços esticados para que eu não desista de alcançá-los. Apesar de tudo, sinto a ponta dos seus dedos, e eles dizem pra eu não cair e nem voltar atrás. Você ainda está comigo nessa aventura burra, perigosa, porém fascinante, e isso me prende à mesma fantasia.