Essas paredes. Quanta história se acumula nelas. Quantas lágrimas
e quantos risos. Quantos segredos e pecados. Quantas vidas elas abrigaram, cada
qual com sua carga, sua confusão e seu valor.
Quanto há de vida e de morte impregnadas nessas estruturas
que conseguem, quietinhas, frias, ir atravessando o tempo?
Quantas ventanias e tempestades elas contiveram do lado de
fora?
E quanto mais essas paredes são capazes de suportar?
Quantos sonhos e frustrações elas testemunharam?
E quanto amor elas refugiaram até hoje?
Essas paredes centenárias. É impressionante pensar em algo
que há tanto tempo guarda e protege. E como faz isso bem!
Abrigo nos inversos, refúgio nos verões, no entanto,
tranquilas e serenas como em um eterno outono sem privar da primavera que não esmorece: sempre vem.
Até hoje, ao longo de tantas décadas, quanto de sono tranquilo
elas já proporcionaram. Assim como novos
despertares: da infância para a adolescência; da adolescência para a idade
adulta; e desta para a dádiva de envelhecer junto e dentro de algo que se
deixou possuir. Que cercou tantos ares e sustentou tantos céus. Infinitos céus!
Ornamentadas com quadros, fotografias, cores... suportes a
todo tipo de registro da existência e, ainda assim, as mesmas paredes, o mesmo
e fiel palco vertical de crenças, esperanças e saudades.
Paredes que um dia alguém sonhou em erguer para guardar tudo
que tivesse e tudo o que fosse. E guardaram. Continuam guardando.
Quantas costas já devem ter apoiado? E mãos? E murros?
O projeto de uma casa até pode se tornar obsoleto com o
passar do tempo, mas essas paredes jamais perderão sua poesia. São sustentáculos
de algo muito maior do que uma casa. São sentimentos, emoções, lembranças,
aprendizados sedimentados. Camadas e camadas de história. São feitas de muito
mais do que tijolos e barro. Elas são feitas de insistência, de luta pela sobrevivência.
Apesar de serem construídas, entendem como ninguém de nascimentos
e renascimentos. Dia após dia, sempre como se fosse a primeira vez, como se
fosse a primeira vida que recebe.
Cúmplices incorruptíveis. Protetoras. Guardiãs. Paredes:
alicerces de templos únicos, incontestáveis. Templos que, abastados ou
humildes, são sempre inestimáveis. Verdadeiras caixas da existência. De muitas
existências. Amiga, confidente e testemunha do tempo, certamente.
Será que sofrem com as perdas?
Será que se deixam contaminar com tanta boa e má humanidade?
Será que sentem saudade?
Talvez sejam apenas cofres invioláveis. O melhor e mais leal
guardador de segredos.
Benditas sejam essas e todas as paredes, bem como todas as vidas que nelas se resguardam. De todas as vidas que reforçam as camadas dessas paredes, um sentimento lhes é comum: a genuína vontade de para elas sempre poderem voltar.
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